Poesie di Salomão Rovedo


Home page  Lettura   Poeti del sito   Racconti   Narratori del sito   Antologia   Autori   Biografie  Guida   Metrica   Figure retoriche


Autunno, inverno
"Essi periranno i vostri gesti e le facce
tra questo e perdere ciò che ho perso. "
Abgar Renault, Percorsi di oblio


Brezza d'autunno rotola mondo itinerante
Lacrime e porta i suoi capelli ricci,
olio di profumo trasporto, pelle,
miscela di mandorle, epidermide freschezza.

L'autunno di quest'anno arriverà prima.
Lo sai? Non sono mai stato a Miami. Ci donne
nascondersi in fiumi di spessore trucco blu:
rughe deletam insondabili, segni, vene varicose.

Prepara il corpo per la lingua (io penso di sì,
Penso ancora molto su di esso e che altro.)
Venite a disinformare autunno pessimista l'anima
con la prospettiva contemporanea del nudo.

Non ho sonno - mi ha chiamato - vieni con me!
Afferrò le braccia li attorcigliato al corpo,
Rig incastonando una, anaconda serpente uguali.
Io giaceva morto, capelli a strati fuoco.

Incollato impossibile. Molto è stato lasciato fuori:
Tromba Winton Marsalis crittografia onda
mare schiuma scuotendo la sabbia,
(Forse è per questo che la sua assenza fa paura).

L'età dei pigri, vento, palme lamento.
E 'la sensazione di autunno che sarà senza paura.
Domani sarà un altro mordere il collo? Mi vengono i brividi ...
Saranno in grado di irritare le mie dita i capezzoli?

Inverno, corpo, terra sacra, l'epidermide,
una vita di campo, ogni nervo pulsa di vita
da tutti i pori - pellet, polvere - non ora,
una miniera di semi: l'amore, il cuore, l'anima.

Il sole ecuadoriano si insinua oltre l'orizzonte. Capisco
trasformare il buio della stanza in penombra,
lanhando tutte le tracce del suo corpo in agonia.
Il foglio è il deserto. Domani non sarà l'altra.

Inverno arriverà entro la fine dell'anno, l'amore?
Ma il suo corpo sarà custodito la memoria:
si accenderà un fuoco proprio lì sotto il ventre
bruciare calore come ulcera, si secca la gola.

Non misurare il contesto di delusione irreparabili.
Ma c'è luce? Duplicity livello? Passi?
Enigmi insondabili, pretese immaginato:
- Solo il pretesto nudo, senza limiti, il calore. Solo.

Corpo. È il corpo. Alla fine di ogni direzione poro.
Al centro del suo petto in basso roccia: anima, passione.
Prima di passare l'inverno, pigiami, biancheria intima, calze,
pantaloni, camicie, si sono rivelati inutili strofinacci.

Guardo rimuginare via in adolescenza. Cosa?
Gosh! Inverno sarà anche presto.
Voglio solo un calore vicino al mio calore. Said.
Poi si stringeva, sorrise, scosse. Sognava ...

Construção
Há o tijolo, que pode ser puro, pedra preciosa
a erigir paredes, muros, sonhos – quem sabe?

Nenhuma construção se faz sem abalar a fé,
se finalmente é necessário dar o primeiro passo.

Telhados de jade irradiam o sonho para dentro:
muitas e muitas casas levantadas sobre nuvens.

Costruzione
C è il mattone che può essere puro, pietra preziosa
ad alzare pareti, le mura, i sogni – chi lo sa?

Nessuna costruzione si fa senza disturbare la fede,
se finalmente ci vuole camminare per la prima volta.

I soffiti di jade irradiano i sogni all interno:
tante e tante case alzate sopra le nuvole.
Traduzione: Renata Appigiongo

Abandono
Sei que vou te deixar um dia
Mas não levo nenhuma alegria
Porque não semeio os laços de dor.
Quem criou entre nós a distância
Só pensou que a inconstância
Vamos colher em vez do amor.
Quando chego fico muito feliz,
Quando parto é a lágrima que diz
Que é hora de viver de saudade.
Tudo não será ironia do destino,
Ou mesmo hipocrisia, desatino,
Dessa besta chamada felicidade.

Abbandono
Lo so che ti lascierò un giorno
Ma non partirò allegro
Perché non pianto il dolore.
Chi ha creato tra di noi la distanza
Ha soltanto pensato che l incostanza
Coglieremo anziché l amore.
Quando arrivo divento contento,
Quando parto è la lacrima che dice
Che è il momento della mancanza.
Tutto non sarà ironia del destino,
O anche ipocrisia, pazzia,
Di questo mostro chiamato felicità.
Traduzione: Renata Appigiongo

Sem destino
Mesmo que se conheça
o dia de amanhã,
mesmo que se saiba
que de manhã estaremos
subindo aos céus,
ainda se tem de tomar
banho, lavar os cabelos
com xampu, fazer a
barba, ouvir Beethoven,
passear à toa por aí...

Mesmo que amanhã,
amanhã de manhã cedo,
seja o dia de estar sentado
ao lado direito do Criador,
ainda assim é pegar o ônibus
e cair na estrada (cabelos
ao vento), com a mulher
amada, passear no mundo,
esse mundo todo errado,
maltratado, que a nós sorri...

Senza destino
Anche se conosciamo
il giorno di domani,
anche se sappiamo
che domani staremmo
nel cielo,
dobbiamo ancora fare
la doccia, lavare i capelli
con shampoo, fare la
barba, sentire Beethoven,
fare un giretto....

Anche se domani,
domani, domattina,
sarà il giorno di essere seduto
affianco della parte destra del Creatore,
anche così è prendere l autobús
e prendere la strada
(i capelli si muovono con il vento),
con la donna amata,
passeggiare nel mondo,
questo mondo tutto sbagliato,
maltrattato, che a noi sorridi.....
Traduzione: Renata Appigiongo


O mar (Il mare)

As areias
Uma casa à beira da ria
sorri para o mar da janela.

No barco verde à deriva
pescadores tarrafeando.

Um sol na quase manhã
é como véu no corpo dela.

Guará goteja o mangue
vermelho içado de verde.

Os catadores de sururus
e caranguejos vermelhos.

Um corpo nu desmaiado
na alvura do lençol azul.

Maria, sim é Maria, é ela
que ri para o mar da janela.

A baía de São Marco
Por aqui começa o mar noutro mar,
a mais fértil terra dos pescadores
- eu penso em ti, em mais ninguém.

E nascem na praia campos de areia,
ali aonde o mar existe e não existe,
- mais louco que nunca para te ver.

O pescador é o camponês do mar,
ameia os peixes de colheita insossa,
- posso jurar ao vento que te amo.

Roçado de sal o pescador recolhe,
siri, caranguejo, flor de manguezal,
- é um mar em forma de sedução.

As hildas
Quando a encontrei era só açúcar,
prazer, dança, doce de goiaba e mel.
Um mar de sal e sol para temperar,
vinho branco e, ou, cerveja gelada.

Criação boa a receita de felicidade:
e assim foi o tempo das maresias,
ondas rasteiras, espaços espectros,
pores de sol. É verdade: o sol se põe?

Todos estão pensando que vou falar:
"Agora tudo é fel" (para rimar com mel),
mas que nada! Só a distância atrapalha
a convulsão mansa de nossa pele úmida.

Se possível, continua doce, mel e mel,
bacuri em calda, condimentos picantes,
sorvete de juçara... Já falei dos lábios?
Ara que boca! Ânsia devoradora! Ora...

As dunas
As crianças correm pelas dunas de areia fina
desviando os galhos verdes dos pés de muricis.
O vento estabanado, cabelos lisos em caudal,
esticam os lábios em sorrisos quilométricos.

Corre menino de areia
Corre direto pro mar,
Corre que o mundo é teia
Pra quem não sabe nadar...

Era domingo sempre, mas o sol não via que era:
crianças livres corriam pelas dunas alvacentas.
A descida é escorregadia, patinam sobre grãos,
imitam anjos de algodão que vivem nas nuvens.

Corre menino de areia
Corre direto pro mar,
Corre que o mundo é teia
Pra quem não sabe nadar...

Gritos se transformavam em cantoria musical
arrastados coloridos longe lá onde o som voa.
Antes que as pegadas dos pés miúdos sumam,
levadas pelo uivo irado do vento, estava o mar.

Corre menino de areia
Corre direto pro mar,
Corre que o mundo é teia
Pra quem não sabe nadar...

Braços abertos são pássaros marinhas crianças,
enfrentam o desafio mais importante de suas vidas.
Para atender o chamado vital do mar, as narinas
dilatadas, correm igual tartarugas recém-nascidas.

Corre menino de areia
Corre direto pro mar,
Corre que o mundo é teia
Pra quem não sabe nadar...

Os sais e os sóis
São as colinas de sal e sol,
o entardecer verde e roxo,
são as águas-vivas na areia,
os galhos podres na praia,

o silêncio da onda quebrando,
enquanto pescadores arrastam,
arrastam a rede no quebra-mar,
são as algas flutuando ao léu,

à noite que chega a barlavento,
são as altas palmeiras penteadas,
o som das dunas que se movem,

são crianças saltitando piruetas,
alguma novela de amor na TV:
todo o Universo relembra você.

Ondas sambas
Domingo na praia
Muito sol a brilhar
Teu corpo na areia
Moreno a dourar

Foi lá que eu te vi
Foi lá que te conheci
Foi lá que te paquerei
Foi lá que te namorei

Fiquei marcando bobeira
Debaixo daquele céu
Teu olhar de feiticeira
Me mandou pro beleléu

E Domingo na praia
Sol quente a brilhar
Senti teu corpo moreno
Muito doidão me deixar

Mar azul os azuis
Um pouco de azul não faz mal a ninguém,
nem o verde que se esgueira entre as casas
ou a mesma estrela multicor que me segue,
cintilando mistérios, emprenhada de segredos.

Faz bem o cristal salinoso que emerge da onda
e penetra entre as frestas das roupas, botões,
a espuma que lambe a epiderme rugosa e sã,
lábios ressecados noutros lábios ressecados.

Não faz mal o cheiro de mar aromatizado,
vasa que entranha e fere as narinas da alma,
nem faz mal a água doce que corre nos dedos
enquanto o rio se mexe direito a outros rios.

Faz muito bem a luz clara, manhã aventurada
que se debruça em cumprimentos e mesuras,
perseguindo o som em partitura emoldurada,
letra de música ministrada às rezas vesperais.

Não é mal despertar sobre o corpo dela em duna,
lençol de areia monazítica, amplo de vivacidade,
salgada sebe, glândulas salivares, cuspe, licor,
pudor rouco, gozo em azul, destilado entre coxas.

As marés
Direi: é sábado, 30 de outubro,
a lua imensamente enorme,
muito maior do que o sol,
acachapante, humilhando
o pouco que restou de nós.

Boa noite antiguíssima lua,
pode entrar, o coração é seu,
aplastra as vagas sem dó:
mete de entremeio o amor,
(afinal eleva-se a palavra).

Não há sentimento, nem maré,
nem provocação no céu vasto,
boa noite amiga lua, lua dela,
pode entrar, aplastam-se as vagas,
o coração é seu, ama-o sem dó.

Digo que é sábado de outubro,
de lua imensa (a mente dorme),
ó sol grande, de joelhos e casto,
indulgente e demasiado humano,
ama um pouco a sombra de nós.

Os mariscos
Saboroso senti-los vivos:
Água do mar na saliva,
uvas tintas de vinhos
e gotas azedas de limão.
Mariscos a la ostra - crus
bom tinto entre garfadas
agora vão morrer na boca
beijo venenoso das deusas.

Completamente de porre,
em Viña del Mar e Reñaca,
Oceano Pacífico valente,
ou no Atlântico pacífico.

São Luis, Rio de Janeiro,
em Araçagy ou Recreio,
sabem o puro rico sabor,
ressecada boca de areia.

Os rios
Cantar os rios, sim, eles são belos
e contemplá-los muito nos ensina.
Mas para que servem as margens?
Sim, o rio tem águas importantes,
transforma as margens em paisagens
passageiras, em visões e miragens...
O rio é, sim, o Rei das Selvas
e das planícies, cujas águas límpidas
formam remansos e correntezas.

Mas - e as margens?
Ninguém canta as margens,
sós os rios e suas águas milagrosas.
Todos cantam, mas as margens,
serão simples terras a desfilar
rapidamente à vista dos passantes?
Terras férteis - filhas fixas e perenes
dos rios, imutáveis barrancos.
O rio passa célere, mas as margens
presenciam vidas verdes,
que ali permanecem pela eternidade.
Volta e meia revoltam-se, mudam de lugar.

Todos cantam os rios, mas as margens?
Os rios são assim: importantes
mais pelas águas cristalinas,
que pela margem.
As estrias das margens enodoam
de humo e lodo o rio e desse
contrastante milagre foi de onde
resultou a vida - não a morte...

Os mares
"Débil llega el mar
hasta mi cuarto
meciéndome
entre sus algas dedos"
Carmen Berenguer

Mar de meditação.
Mar primordial.
Mar principalmente carioca.

Origem e fim de tudo,
bate no Rio de Janeiro
mandado por Iemanjá
ou por Posídon.
Banha Uiaras de areia,
engole atrevidos, ousados.

Mar de cores impuras,
que manda a saúde embora.
Bendito seja o fruto
do teu profundo ventre,
zelai os pescadores.
Trazei no toldo das ondas
o alimento de todos os dias,
o sal amargoso do batismo,
o sal da fé e da vida.

Mar que aceita surfistas,
travessos amantes notívagos,
ambos enfeitiçados
pelo encanto das sereias.
Barcos, iates, saveiros,
mar de engolir navios.

Mar de desertos e praias:
Copacabana - verde de musgo,
Arpoador - altar de beleza,
Ipanema - convite ao carinho,
Leblon - caminho da Barra.
Grande ventre de silêncios,
algas negras que geram
moléculas viscerais,
amniótico líquen,
negro ventre abençoado,
rezai por nós predadores.

Mar perdido por meandros
das praias do Recreio,
lagoas, seios, pântanos,
coxas, restinga de Vênus,
rumo a outros litorais.

Mar de liturgias e orações,
mar essencial, onde navegam
pensamentos e pirilampos,
mar que é rio, mar de rosas,
mar da antropogênese de nós.

Os lençóis dunas
Dentro da praia deserta
Dentro do ventre do mundo
Não durou nem um segundo
Estar nos braços de Rita

Foi num dia de domingo
Um dia não uma noite
A ventania bailava o açoite
Na cabeleira de Rita

De longe divisei o Farol
Que me guiou para a praia
Nos braços de uma sereia
Que tinha o cheiro de Rita

A estrela que me guiou
E me livrou do tormento
Embaçou por um momento
As coxas negras de Rita

E ali mesmo me salvei
Foi um momento divino
Quis o sereno destino
Atracar no porto de Rita

E fui navegando a esmo
Nas dunas alvas dos Lençóis
Ao som das ondas bemóis
Bailava o sorriso de Rita

Sem documento ou celular
Sem passado nem futuro
Vou vivendo a cor do ouro
Na identidade de Rita

Por avenida tenho o deserto
Minha casa eterno oásis
A alma carregada de paz
Respiro o hálito de Rita

Ei meninada corre cá
Me diz quem é tua mãe
Não precisa nem dizer
É tudo escritinho a Rita!

As ondas
Entre dois horizontes,
entre o céu e a terra.

Entre quatro paredes,
entre o teto e o chão.

Entre os oito caminhos,
entre o muro e a estrada.

Entre os doze oceanos,
entre a margem e o vão.

Entre quatorze destinos,
entre mim e o amor dela.

Entre dezoito infinitos,
entre a nascente e o mar.

Entre vinte tormentos,
entre o começo e o fim.

O dia mágico
Braços abertos, correndo contra o vento.
Por que de repente veio essa lembrança?

Só se foi o retrato de um dia da infância,
brincando na areia dura de Olho d'água.

Chorar a vida, se de tudo um pouco eu ri?
Esquecer pequenos amores que não tive?

São sonhos, terra para a lavratura, medos,
plantei-os tais sementes que jamais brotam.

Mas havia o demônio, indômito hóspede,
insaciável, Agnus Dei, libera-me Dominé.

Sobrevivendo à morte e à transfiguração,
arma teleguiada: um coração que explode.

A alegria me alegrou, de tristeza entristeci,
enquanto o tempo disfarça perigosamente.

Enquanto não metamorfosear em calendário,
uma data de nascimento, transporte e destino.

A data na lápide, a citação na enciclopédia,
verbete de biblioteca, livro que ninguém lê.



Três noturnos...
 

(Nº 1)
Quando a minha noite chegar
e se fechar manta sobre mim,
vai me encontrar o pequenino,
não verá o velho ancião não,
mas aquele mesmo menino
filho das noites sem calafrio.

Quando essa noite me visitar,
verá o mais breve reencontro
entre a paz total e a escuridão,
vai encarar o mesmo olhar
que nela previra o desatino,
o habitante da noite devassa.

É primavera em algum lugar,
aqui a escuridão se debruça
a matutar porque não a temo.

(Nº 2)
Se pressentisse pobre, temeroso,
breves sinais de Sua existência,
leve caminho, eternidade, instante,
tivesse Deus a mim escolhido,
pespegando-me que fosse chaga,
seria eu uma de Suas moradas?

De repente está tudo claro, claro,
noutro tempo escurece de repente,
tal qual a primavera em outra terra.
Venci na existência tantos deuses:
não sei quando este virá, se existe,
onde está, se Deus é êxito em fé.

Se alguém quer ser feliz e alegre
que seja hoje, porque amanhã
nenhuma coisa se pode garantir.
É certo encontrá-Lo algum dia...
Outubro! Quem diria que apura
em mim coragem, não incerteza?

(Nº 3)
Podem conservar meu coração salpreso, as vísceras não,
mas que será do peito em que baterá um coração ferido?
Eis o que resta: pernas, braços, costelas, pomo de Adão.
Mais tarde estarei comendo grama e margaridas pela raiz.
Êta mundo sem sucesso, sem nunca se dar por vencido...
Foi assim que gozei a dor sem jamais me sentir desinfeliz.

O que não foi? O que fiz? O que foi? O que não fiz? Tudo.
Um dia na vida fui o Cavaleiro da Triste Figura – e errante
tive de gritar, gritei, chorei, nu esperneei, ri de todos e tudo.
Podem conservar o coração salpreso, transborda emoção.
Sabe? Se for bater em outro peito, talvez chorará sofrido,
porque jamais tem cura esta ferida a nós legada por Adão.


 

...E dez valsas
 

(Nº 1)
A alma em sereno repouso,
espera por um canto para
alquebrar esta falsa paz.
O que fazer agora? Lembrar
e andar, cantar revolvendo
os cantinhos da memória.

(Nº 2)
Tradição, disciplina, excelência.
Tramóia, decadência, excremento.
Três princípios de honra e horror.
Tornem suas vidas imperfeitas.
Poetas ergam o nariz sem nojo,
Sujem os dias com seus versos.

(Nº 3)
Ela anda em sensual esplendor,
desesperadamente calada.
Procura voz própria e encontra
tudo, tudo de outra maneira.
Mesmo a voz alheia inspira
a sugar a essência da vida
mas ela hesita, desmaia, foge...

(Nº 4)
Lua azul, dia finito, ambíguo.
Desperto sob o telhado cinza.
Cabelo castanho avermelhado.
Porta branca, pessoas negras.
Velhos cavalos tordilhos baios.
A terra amazônica desmaia.
A mata expira pardacenta.
A água retinta o capim seco.
Teto enfumaçado brumoso.
Um esqueleto descorado.
Tempo sombrio – queimada.
Estrume, cinzas, sebe negra.

As telhas cobertas de musgo
se desesperam contra o céu.

(Nº 5)
Nuvens são véus de noivas no céu,
no vento zefirino, azul, transparente.
O sol é pupila que doura os corpos.
Noivas, nuvens alvas, encarnadas.
Ipanema, bela Ipanema, ela morena,
chopes gelados, chopes dourados.
Noivas nas igrejas, noivas domingo,
grinaldas de orquídeas, rosas, rosas.
Alvura nos vestidos virgens, a gente
na praia, em alegre zanguizarra.

Secular gesto: quem será a festiva
premiada com o buquê, a simpatia
poderosa, mágica, infalível, fatal
da toda poderosa flor-de-laranjeira?

(Nº 6)
A vida nos dá prazeres,
cosmos de surpresas,
mas não deixa escolha:
– é viver ou viver.
                  (Eterna, com certeza.)
Assim quando chega
a pessoa amada:
basta um olhar,
sentir a eletricidade.
                   (De mansinho, felino.)
Então para sempre
seguir a correnteza:
breve vida escrava,
é vulcão, fogo, lava.
                    (Vida encantada.)
Não serei o Anjo Triste,
aquele que dá notícia
dos amigos que caíram
durante a jornada, não.
                    (A vida é porrada.)

(Nº 7)
Toma o meu coração porque
prometi te amar para sempre.
Lembra daquela ocasião?
A vida bela, o amor é lindo,
pode tudo, pede a alegria,
céu azul, calor, frente fria.
A simplicidade das coisas,
simplesmente a emoção,
– pode também a paixão.

O amor é vida, é drama,
feito encontro de rua,
pode tudo, luta, pede lua.
Prometo-te a vida bela,
invento o amor mais lindo,
o céu sem nuvem azulino.

Só não te prometo a lua
(sem ela não há alegria,
nem céu azul, noite fria).
Isso! Toma meu coração,
porque sei que vou te amar
– eternamente vou te amar.

(Nº 8)
Corri atrás dos meus sonhos,
coração de ouro, sem pensar
– sem contabilizar pesadelos.
Eras meu sonho? Eras a vida?

Corri atrás dos meus sonhos,
te encontrei, carne viva, alma,
– e não estavas nos sonhos.
Sonhei meu sonho. Vivi a vida...

(Nº 10)
Quem acha que se pode viver
só pelo prazer dos dias,
– merece a solidão.

O sol e a praia cheia de gente,
o dia de riso, o que nasce,
– a fome, a sede...

Divide-se o céu com os amigos,
o inferno não precisa de gente:
– é deserto árido.

O trigo não produz espinho,
ouro e chope, azul e vinho,
– dividimos com amigos.

O inferno se goza solitário,
masturbação mal sucedida,
– porque se perdeu.

Coração, sorriso, o futebol,
escola de samba, pagode,
– tudo, amigos, é divisível.

O que não se divide é a dor,
o inferno descrito nos astros,
– porque é finito.

(Nº 9)
Para que poesia hoje? Belas
palavras não chegam fáceis,
são como balas perdidas:
elas circulam em silêncio,
aproximam-se impertinentes,
fatais, penetrantes, assassinas.


Home page  Lettura   Poeti del sito   Racconti   Narratori del sito   Antologia   Autori   Biografie  Guida   Metrica   Figure retoriche